plural

PLURAL: os textos de Juliana Petermann e Eni Celidonio

Ouro para a Olimpíada
Juliana Petermann 
Professora universitária

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Esportes. Nada contra. Muito pelo contrário. Até tenho amigos que praticam e gostam. Na época do colégio, na educação física, eu estava entre aquelas que sobravam na escolha dos times. "Parece que tem medo da bola!", dizia a minha professora. E tinha mesmo. Pequenos traumas de infância devidamente encaminhados para o divã. Hoje, fiz as pazes com os exercícios físicos, mas confesso que os esportes nunca ganharam meu coração. Nunca me vi em uma quadra. E esse é, justamente, o ponto que quero discutir aqui.

OUTRAS CARAS NO PODUIM

Eu sou da época em que a professora dividia: meninos para um lado, meninas para outro. Joguem. Felizmente, os tempos são outros. As aulas de educação física, eu espero que também sejam outras. E mesmo que não seja o meu forte, tem algo nos esportes que eu gosto muito: assistir às Olimpíadas. Na última semana, as competições em Tóquio começaram e vi alguns indícios importantes de que os esportes, felizmente, também já não são os mesmos. Os primeiros atos olímpicos foram marcados por episódios importantes no que diz respeito à representatividade. Douglas Souza, o primeiro jogador da seleção masculina de vôlei declaradamente gay dá novos ares ao time: genuíno, cheio de carisma, não apenas definiu a partida contra a Tunísia como desfilou pelas ruas de Tóquio, dublou a Pabllo Vittar e virou fenômeno. Além disso, a halterofilista transgênero Laurel Hubbard, da Nova Zelândia, será a primeira pessoa transgênero a competir nos Jogos Olímpicos. Ainda no início do tempo regulamentar, Tóquio já quebra um importante recorde: é a edição com maior número de atletas LGBTQIA+. São 163 pessoas que se declaram lésbicas, gays, bissexuais, trans e não binárias.

JUNTAS NAS QUADRAS

Na minha infância, o futebol e o skate eram esportes dos meninos. Hoje, a seleção brasileira de futebol feminino, e, principalmente, a alagoana Marta, eleita seis vezes a melhor jogadora de futebol do mundo, são referências. A skatista Rayssa Leal, a Fadinha, 13 anos, é a brasileira mais jovem na competição e medalha de prata. "Nós podemos sonhar os mesmos sonhos que um menino", diz ela. 

No dia 25 de julho, dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, a ginasta Rebeca Andrade deu um Baile de Favela em Tóquio. Marta, Rayssa e Rebeca são um espelho possível para que as meninas também se vejam no futebol, no skate, nos tablados e no podium. Com elas, consigo me ver nas quadras. Agora, eu e tantas outras estamos lá. Juntas. Na maior parte das vezes, quem acha que representatividade não importa é porque sempre esteve e sempre se viu representado.

E lá vem o frio de novo
Eni Celidonio
Professora universitária

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Vejam bem: não tenho nada contra o frio nem contra o calor. Sério... Mas vocês hão de convir que é muito mais tranquilo o calor. Explico.

No calor, bastam uma camiseta, um short e sandálias nos pés. E estamos vestidos. Mas no frio... Olha, é de chorar. Sair da cama cedo, colocar os pés fora do cobertor e encarar um chuveiro é dose. Desculpem, mas é dose! A toalha é desconfortável, porque parece que acabou de sair da máquina de lavar roupa, e por falar em roupa, devia ter uma que a gente usasse no banho, que nem aquelas de mergulho, sabe? O chão é frio, a água começa fria, o ar é frio, tudo é frio. E não adianta dizer "ué, liga um aquecedor, criatura!", porque mesmo que esquente o banheiro, não esquenta a casa, o corredor do prédio, a garagem... Ah, isso para quem tem um teto, né?

Sempre que chega o inverno, aqui em Santa Maria, eu penso nas pessoas que não têm como se esquentar, que não têm sequer um cobertor, um casaco, sei lá, alguma coisa que deixe o corpo mais, digamos, confortável. É desumano o que a gente vê pelas ruas. Não adianta, eu penso que inverno só é bom para quem tem abrigo, conforto. Pode parecer piegas, pode parecer coisa de quem não tem mais o que fazer, mas é isso que penso. E antes que me atirem pedra, já vou avisando que, todo ano, faço limpeza nos armários e me desfaço do que não uso mais. Claro que não resolve o problema, mas ameniza...

Aqui, bem na frente do meu prédio, havia um senhor com um carrinho de supermercado que, praticamente, morava embaixo da marquise de um prédio abandonado. Durante o dia, ele sumia, mas guardava suas coisas bem arrumadinhas num canto, chegava de tarde, arrumava tudo no chão e dormia até o dia seguinte. Um belo dia, um sujeito chegou com um colchão para que ele ficasse melhor acomodado e ele recusou, porque seria difícil de carregar. Nos dias mais frios, ele se cobria todo, sumia embaixo de jornais e trapos, e o mais incrível sempre será a reação das pessoas: enquanto uns ficavam com pena, levando comida e agasalhos usados para o sujeito, outros achavam um absurdo ter como vizinho aquele sem teto, sabe-se lá o que ele estaria tramando, vai que ele tivesse uma faca e tentasse assaltar um transeunte, ou pior, tentasse entrar no prédio quando alguém acionasse o portão da garagem... Haja neura!

No final da semana passada, ele já não estava mais por aqui. Não sei se escolheu outra marquise para se abrigar, se foi acolhido por algum parente, ou pelo Poder Público, não sei. Mas desde o dia que não o vi mais, fico pensando que fim ele levou.

Esse é o problema do inverno: o frio é cruel. Agora imaginem o sujeito passar frio e ainda ter fome! Sem emprego, com frio e com fome! Ninguém merece... Dizem que essa pandemia vai nos tornar seres humanos melhores. Será que essa pandemia vai nos deixar mais solidários?

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